Quando pensamos em mudanças climáticas e aquecimento global, logo projetamos a imagem de condições de calor extremo, devido às altas temperaturas provocadas pela incidência solar excessiva. Mas os problemas relacionados a esse fenômeno que estamos vivenciando são muito mais abrangentes do que isso.

O aquecimento global pode ocasionar a desertificação de muitas regiões, sejam elas agrícolas ou povoadas por comunidades que habitam as zonas rurais. A tendência de ocorrência de queimadas é agravada com o aquecimento global, assim como o derretimento de geleiras das calotas polares e desastres e catástrofes naturais como tufões, tornados e tsunamis.

As regiões agrícolas também sofrem devido a alteração dos regimes de chuvas, o que afeta muito os agricultores que não possuem irrigação artificial em suas plantações. Isso provoca uma série de consequências para a agricultura, para a economia e para a segurança alimentar.

O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 13 (ODS 13 – Ação Contra a Mudança Global do Clima) visa tomar medidas urgentes para prevenir e combater a mudança do clima e seus impactos. Esse objetivo traz consigo metas a serem alcançadas até o ano de 2030.

Escassez de água poderá comprometer áreas agrícolas no mundo todo

Um estudo da Academia Chinesa de Ciências alerta que a falta de água, devido às mudanças climáticas, poderá comprometer a agricultura, devastando até 84% das áreas agrícolas em todo o mundo até 2050.

As culturas agrícolas como a soja e o feijão são altamente afetadas pela falta de água, provocando abortamento das flores. Embora já existam variedades tolerantes à seca, que minimizem esse impacto, e consequente perda de produtividade da lavoura; práticas como plantio direto e irrigação podem auxiliar na retenção e acréscimo de água, respectivamente, reduzindo o problema de falta de água.

Estratégias para aumentar a resiliência à falta de água e as metas do ODS 13

Os países agrícolas precisam desenvolver estratégias para reduzir o impacto de futuras secas e, no Brasil, o uso da irrigação controlada está entre as adaptações tecnológicas mais plausíveis. Para isso será importante quantificar o risco que os agroecossistemas estarão sujeitos nas diferentes regiões do país. No entanto, é uma tarefa bastante complexa devido à dimensão territorial brasileira, à diversidade de cultivos, aos sistemas de produção e à disponibilidade de recursos naturais.

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) apoia iniciativas como The Agricultural Model Intercomparison and Improvement Project (AgMIP) e o projeto Intercomparação, Aprimoramento e Adaptação de Modelos de Simulação de Culturas Agrícolas para Aplicação em Mudanças Climáticas (AgMIP-BR). Esses projetos têm buscado acelerar os avanços de parametrização e validação de modelos que identificam e avaliam as incertezas na produção agrícola decorrentes das variações climáticas. Buscam também explorar diferentes ações de adaptação, principalmente aquelas referentes às práticas de manejo da agricultura, incluindo as de irrigação.

De acordo com o e-book Água e solo na agricultura sustentável, a necessidade da irrigação pode ser obrigatória, quando os cultivos acontecem em ambientes protegidos, no caso de casas de vegetação, ou em regiões em que a quantidade de chuva anual seja inferior a 400 mm. Nas situações, em que a pluviosidade é maior que 600 mm ou áreas em que determinados meses dos anos os volumes são muito baixos, a irrigação suplementar torna-se uma alternativa, para melhorar a produtividade ou garantir produção na entre safra.

Sistemas de irrigação eficientes para manejo do uso da água

Existem diferentes métodos e sistemas de irrigação, divididos basicamente em aspersão, superfície e localizados e, para cada um desses métodos, diferentes sistemas. Não existe um método ou sistema ideal, mas sim há uma série de fatores que devem ser considerados no momento da escolha de qual utilizar, como a disponibilidade de água e energia, clima e solo do local, tipo de cultura, qualidade da água, topografia do terreno, mão-de-obra, recursos financeiros, entre outros.

O método de aspersão é caracterizado pela água aplicada na forma de pulverização das gotas sobre a folhagem da cultura e sobre o solo. É constituído por aspersores de impacto (muito utilizado na irrigação de hortaliças e pastagens), pivô central e autopropelido (também conhecido como carretel enrolador).

Outro método, que vem ganhando destaque nas últimas décadas são os sistemas localizados, como o gotejamento e a microaspersão. São caracterizados pelo baixo consumo de água e energia e pela alta frequência de irrigação. No sistema de gotejamento, a água é liberada em pequenas gotas ao pé da planta, diretamente sobre o solo e isso chega a reduzir em 50% o consumo de água. Têm sido muito bem empregados para irrigação de culturas perenes, como café, citros, uva, manga etc., assim como hortaliças. Embora tenha um investimento inicial superior aos outros sistemas, viabiliza a irrigação onde não há muita disponibilidade de água e na maioria dos casos, reduz mão-de-obra, porque é acompanhado de automação e permite a injeção de fertilizantes pela água (fertirrigação).

Um outro método é a irrigação por superfície no qual se destacam a inundação e a irrigação por sulcos. Um método caracterizado por utilizar a força da gravidade para o movimento da água, o que dispensa o uso da energia. O Brasil tem uma área de aproximadamente um milhão de hectares destinada à irrigação de arroz por inundação, a maioria localizada no sul do país.

Entretanto, é importante destacar que existem questões legais sobre o direito ao uso da água. Para qualquer interferência nos recursos hídricos há necessidade de autorização do órgão ambiental do estado, pelo título de outorga do uso da água. A outorga é necessária nos casos de captação, seja superficial (rios, lagos etc.) ou subterrânea (poços). Ainda que a vazão necessária seja pequena é importante consultar o órgão responsável. No caso do estado de São Paulo é o Departamento de Água e Energia Elétrica (DAEE).

Manejo adequado da irrigação pode contribuir com a mitigação das emissões de gases do efeito estufa (GEE)

Algumas pesquisas já mostraram resultados promissores no uso de irrigação para mitigação de emissões de GEE que potencializam o aquecimento global. O manejo intermitente da irrigação por inundação em arroz pode reduzir a emissão de gás metano (CH4). A fertirrigação vem trazendo resultados favoráveis no controle das emissões de GEE do agroecossistema como um todo pela substituição de diesel por biogás em motogeradores e motobombas e pela substituição da adubação mineral. O ganho na produtividade também abre a possibilidade de recuperação da vegetação nativa em uma fração relativa da área produtiva. Em termos de mecanismo de adaptação à mudança do clima, a restauração relativa de áreas de mata nativa favorece a recuperação e/ou manutenção de outros importantes serviços ambientais, como o aumento da biodiversidade, a produção de água e incremento da polinização por insetos.

Por essa razão, um material para orientar produtores rurais em áreas do Pantanal foi lançado em 2021, o Guia de melhores práticas pecuárias da planície pantaneira, uma iniciativa da WWF-Brasil, Embrapa Pantanal e Wetlands International. O guia foi elaborado por especialistas como forma de orientação aos produtores em como conciliar a produção com a manutenção do ritmo, amplitude e duração das áreas úmidas do Pantanal – principal fonte de água daquela região.