Você já parou pra pensar nas origens da grande diversidade cultural do Brasil? É comum a gente associar culturas e tradições com músicas, danças, festivais, cores e lendas, que são, quase sempre, influenciados por imigrantes e pela etnia de populações nativas. O que muita gente não percebe é que a culinária e os artefatos estão sempre presentes e, muitas vezes, são a base de todos os demais componentes culturais de um povo.
É só observar que toda comida típica ou artesanato de uma determinada região sempre tem ligação com a cultura agrícola mais comum ou mais bem adaptada ao lugar dessas manifestações culturais.
Um exemplo disso são as bonecas Karajá “Ritxòkò” feitas por artesãos tocantinenses. Elas foram declaradas patrimônio cultural do Brasil em 2012 e são uma referência cultural significativa para o povo Karajá, nativo das margens do rio Araguaia. Eles usam palha de milho, palha do babaçu (espécie de palmeira comum na Região Norte do Brasil), capim dourado, cerâmica, cristal, jatobá (árvore que pode ser encontrada na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e na Mata Atlântica) entre outras.
Muitas das plantas cultivadas no Brasil não são nativas. Foram trazidas por imigrantes. Com isso, eles consolidaram o cultivo de diferentes espécies nas nossas regiões e o ambiente (clima, solo, umidade) facilitou a adaptação das plantas. Consequentemente, essas plantas serviram de ponto de partida para o desenvolvimento de costumes e tradições que marcam a história das populações de cada local. Com o tempo, o uso da tecnologia e do melhoramento genético fez com que a agricultura ganhasse muito mais espaço. Hoje, apesar da agricultura ser uma potência no universo do agronegócio mundial, a nossa cultura e os nossos costumes permanecem.
Toque regional
É difícil dimensionar a imensidão da influência dos cultivos agrícolas na cultura dos povos do mundo todo. No Brasil, são vários os exemplos de comidas típicas baseadas nas atividades agrícolas regionais, como o famoso queijo de Minas, o coco da Bahia, a uva e o vinho do Rio Grande do Sul.
Os alimentos típicos brasileiros têm uma diversidade de sabores que acompanha a história do nosso país. Foram influenciados pelas plantas cultivadas, também por nativos e imigrantes, além dos fatores ambientais como solo, clima, disposição geográfica, flora, fauna e outros recursos naturais. Alguns bons exemplos comprovam toda essa influência:
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Norte: os pratos mais típicos da região, como o Pato no Tucupi e o Tacacá, são feitos a base de mandioca, uma cultura herdada dos índios. A região norte lidera a produção de mandioca no país, mas também é representada por frutas silvestres, como açaí, cupuaçu, guaraná e graviola, e pela castanha do Pará, em sua maioria constituída por frutos originários da Amazônia, o que justifica a representatividade das plantas na região.
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Nordeste: além da mandioca (farinha), essa região é marcada por uma variedade de alimentos básicos como o feijão, a carne de sol, a rapadura, o milho, peixes e frutos do mar, principalmente no litoral nordestino. O milho é a base dos pratos mais típicos do Nordeste, como o angu e o cuscuz, além de ser uma das principais culturas do país. Também são típicos da região a abóbora com leite, queijo com rapadura, batata doce com café, doce de leite com banana, polenta com leite, água de coco, galinha de cabidela, acarajé, vatapá, abará e caruru. Essa grande variedade de alimentos comumente consumidos no Nordeste recebeu forte influência indígena assim como portuguesa e africana.
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Centro-oeste: nessa região, a culinária é caracterizada principalmente por peixes, carnes, mandioca e milho, além do pequi, um fruto nativo do Cerrado que dá um gosto especial no famoso arroz com pequi e na galinhada do estado de Goiás. Essa região também é muito representada pela pamonha, feita com milho verde. Muitos dos pratos típicos da região são à base de mandioca, como vaca atolada, mojica de pintado e caribéu. Além disso, a proximidade com países vizinhos, entre eles Paraguai e Bolívia, alguns pratos como sopa paraguaia e arroz boliviano se tornaram típicos da região centro-oeste.
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Sudeste: queijo de Minas, café, angu com quiabo, couve à mineira, canjiquinha com carne, curau, pamonha são alguns pratos típicos do estado de Minas Gerais. Já no Rio de Janeiro e em São Paulo fica difícil eleger um prato típico devido ao cosmopolitismo de suas cozinhas. Mas as mais variadas hortaliças presentes nos pratos dos paulistas tiveram forte influência da imigração japonesa no Brasil.
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Sul: essa região é marcada pela grande influência dos italianos com uvas, vinho, pães, queijos, salames, massas e sorvetes; e dos alemães com batata, centeio, carnes defumadas, cerveja e linguiça, além do hábito do café colonial com cuca, torta de maçã e bolo de frutas. Mais especificamente no Rio Grande do Sul, é típico o consumo de arroz com charque (arroz carreteiro) e o famoso churrasco gaúcho. Assim como nas demais regiões, a maioria dos alimentos que compõem os hábitos alimentares do Sul são de atividades agropecuárias da própria região, sendo algumas das plantas cultivadas bastante adaptadas ao clima frio como a maçã, a uva, o arroz, o centeio e o trigo.
A cultura e os costumes alimentares de cada região permanecem até os dias de hoje, mas a agricultura sofreu várias transformações que influenciaram e ainda influenciam o desenvolvimento do país.
O vinho é do Sul, mas o Nordeste também produz uvas
Os italianos foram os precursores da vitivinicultura brasileira que dominou e domina até hoje o Rio Grande do Sul. Foram eles que trouxeram, além das cepas, o hábito do consumo do vinho como um alimento, e o ainda chamado espírito vitivinícola. Hoje o estado é o maior produtor do país e possui reconhecimento internacional na produção de vinhos.
Porém, nos últimos anos, as pesquisas em melhoramento genético permitiram que o Nordeste ganhasse espaço significativo na produção de uvas no Brasil. Atualmente, a região responde por quase 30% da produção nacional, tornando-se a segunda maior produtora do país.
Tecnologia na agricultura traz qualidade de vida
Ao longo da história brasileira, a agricultura passou por diversos ciclos e transformações. Muitas das culturas agrícolas que antigamente eram restritas a uma determinada região tiveram influência do avanço tecnológico e se expandiram para diversas regiões do país. O melhoramento genético, a mecanização e utilização de diversos insumos são alguns exemplos da modernização da nossa agricultura.
Essa modernização está diretamente associada ao processo de industrialização a partir do século XX. Um período que influenciou o crescimento e desenvolvimento dos grandes centros urbanos, onde campo e a cidade tornaram-se dependentes um do outro. De um lado, a necessidade dos produtos agrícolas que são base da alimentação e utensílios humanos e, do outro, técnicas e produções industriais como máquinas, equipamentos e defensivos agrícolas. É uma conexão do campo com a cidade que gera empregos, melhora a qualidade de vida das pessoas e impacta positivamente na economia do país.
Esse modelo de agricultura no século passado ficou conhecido como Revolução Verde e teve como fundamentos a multiplicação da produção de alimentos, o que ajudou a amenizar os problemas relacionados à questão da segurança alimentar.
Temos atualmente mais de 63 milhões de hectares de agricultura no Brasil de acordo com o último Censo Agropecuário. A região que mais se expandiu foi a Centro-oeste, a do Cerrado, composta pelos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal. É a região onde mais se produz soja, milho, arroz e algodão, culturas de grande importância econômica, tanto no mercado nacional como no mercado externo.
O tempo passa, mas a cultura fica
Mesmo com a expansão agrícola e o desenvolvimento socioeconômico da população, cada estado ou região brasileira carrega seus costumes e tradições, herdados por um povo diverso culturalmente. Ainda é possível chegar em cada região e pedir aquela comida típica que você deseja experimentar, com o aroma e sabor que carregam uma longa história e acompanham várias gerações.