À medida que avançamos para uma realidade de recuperação pós-pandemia, nos deparamos com maior instabilidade e desigualdades de desenvolvimento entre as nações. Promover estratégias para adoção de medidas urgentes no combate à pobreza e desnutrição é um dos objetivos principais da cooperação Sul-Sul das Nações Unidas.
Entendemos a cooperação Sul-Sul como uma colaboração técnica entre os países em desenvolvimento do Sul. É uma ferramenta utilizada por estados, organizações internacionais, acadêmicas, sociedade civil e setor privado para compartilhar conhecimentos, habilidades e iniciativas bem-sucedidas em áreas específicas como desenvolvimento agrícola, direitos humanos, urbanização, saúde, mudanças climáticas etc. com o objetivo de atingir metas de desenvolvimento por meio de esforços conjuntos.
O Dia das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul, comemorado em 12 de setembro, foi proclamado pela Assembleia Geral para destacar a importância da cooperação Sul-Sul e marcar a data em que ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento em 1978. Foi nessa data que se adotou o Plano de Ação de Buenos Aires para a Promoção e Implementação da Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento.
Nessa data, temos a oportunidade de refletir sobre nosso compromisso com as soluções urgentes de desenvolvimento, como a luta contra a fome e a desnutrição. E uma das iniciativas que o Brasil possui para contribuir com essa temática é o projeto para combater a desnutrição nos países em desenvolvimento, por meio da produção e consumo de alimentos biofortificados.
Biofortificação de alimentos e sua importância no combate à desnutrição
Alimentos biofortificados são aqueles que sofreram modificações por meio de estratégias de melhoramento genético, onde foram incrementadas quantidades de elementos de valor nutricional, aumentando aminoácidos, minerais, proteínas, enzimas ou vitaminas. Desse modo eles passam a ser mais nutritivos do que aqueles que não passaram por esse processo de melhoramento.
A essência do programa de biofortificação é enriquecer alimentos que já fazem parte da dieta da população para que as pessoas tenham acesso a produtos mais nutritivos e que não exijam mudanças de seus hábitos de consumo, como estratégia para reduzir a desnutrição. As espécies de plantas e cultivares mais promissoras são selecionadas no campo e seguem para a etapa de melhoramento. Nessa etapa, o objetivo é obter cultivares mais nutritivas, mas que também apresentem boas qualidades agronômicas (produtividade, resistência à seca, pragas e doenças), além de boa aceitação de mercado.
Projetos com biofortificação de alimentos reúnem pesquisadores da América Latina, África e Ásia
No Brasil, diversas unidades da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) estão envolvidas em projetos de biofortificação de alimentos, conhecido como BioFORT tendo como foco o melhoramento de alimentos básicos como arroz, feijão, feijão-caupi, mandioca, batata-doce, milho, abóbora e trigo. A Rede BioFORT busca diminuir a desnutrição e garantir maior segurança alimentar e nutricional através do aumento dos teores de ferro, zinco e vitamina A na dieta da população mais carente.
Os projetos têm ainda ações de desenvolvimento de produtos agroindustriais a partir de matérias-primas biofortificadas e a formatação de novas embalagens, capazes de conservar os micronutrientes por mais tempo. O programa brasileiro tem ainda suporte do programa HarvestPlus, um consórcio de pesquisa que atua na América Latina, África e Ásia com recursos financeiros da Fundação Bill e Melinda Gates, Banco Mundial e agências internacionais de desenvolvimento.
Muitos desses países têm deficiência nutricional por falta de minerais e vitaminas presentes na alimentação. Com as plantas biofortificadas amplamente consumidas, podemos reduzir bastante ou praticamente eliminar, em alguns casos, a deficiência de alguns desses nutrientes.
Experiência brasileira na fortificação de alimentos é compartilhada com países da África e da Ásia
No último ano, o Centro de Excelência contra a Fome do Programa Alimentar Mundial (WFP, sigla em inglês de World Food Programme) apoiou a participação do Governo do Brasil em um evento na Costa do Marfim, compartilhando experiências sobre boas práticas brasileiras em fortificação alimentar com a Índia e a Costa do Marfim. Foram apresentadas as principais diretrizes nacionais de fortificação em larga escala e as metodologias de monitoramento e uso de evidências para ajuste da política.
O governo brasileiro apresentou no evento o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), uma iniciativa que atinge 20% da população brasileira por meio de parcerias com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o WFP e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
A cooperação Sul-Sul e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da ONU representa um importante compromisso entre os países na adoção de medidas para alcançar os 17 Objetivos e 169 Metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre eles, o ODS 2 – Fome zero e agricultura sustentável, traz a meta de se aumentar o investimento, inclusive via o reforço da cooperação internacional, em infraestrutura rural, pesquisa e extensão de serviços agrícolas e desenvolvimento de tecnologia.
A pandemia de Covid-19, as crises climáticas e a guerra na Ucrânia compõem outros grandes desafios que ameaçam o progresso no alcance dessas metas. Tudo isso reforça a importância da cooperação Sul-Sul para garantir que continuemos avançando na recuperação de perdas e na promoção do compromisso global de não negligenciar aqueles que mais necessitam do nosso apoio.
Os membros da cooperação entendem que a troca de conhecimentos, habilidades, experiências e lições aprendidas entre os países do Sul global servem como um poderoso catalisador para o desenvolvimento, sendo fundamentais para parcerias globais inclusivas em direção ao desenvolvimento sustentável. Por esse motivo, o Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul trabalha para registrar, sistematizar e facilitar o acesso ao conhecimento de desenvolvimento do e para o Sul global com uma série de publicações chamadas de Boas Práticas em Cooperação Sul-Sul e Triangular para o Desenvolvimento Sustentável. A iniciativa tem como objetivo documentar o incrível trabalho que está acontecendo atualmente no Sul global.