A pandemia intensificou o quadro da fome entre os brasileiros. Mais da metade da população convive com a insegurança alimentar e o País ocupa a 10ª posição no ranking de países que mais desperdiçam alimentos (23,6 toneladas por ano, segundo a FAO/ONU). Os dados parecem contraditórios, mas fazem parte do mesmo contexto. Somos um país agrícola com grande perda de alimentos no pós-colheita e no escoamento da safra. Isso sem falar no desperdício no final da cadeia agrícola e no consumo de alimentos.

Na agricultura, as perdas começam no campo e passam pelo transporte e armazenamento dos alimentos. Como se não bastasse isso tudo, ainda existe o desperdício de comida pelos consumidores. De acordo com pesquisa da WWF com apoio da Embrapa e FAO, os brasileiros combinam características de países subdesenvolvidos com hábitos de consumo de nações mais ricas.

Estudo da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que cerca de um terço (1,3 bilhão de toneladas) dos alimentos produzidos para consumo humano é perdido ou desperdiçado no mundo. A perda acontece quando o descarte não é intencional, podendo acontecer em toda a cadeia produtiva, em várias etapas da produção e costuma ser decorrente da falta de estrutura apropriada (problemas na colheita, armazenamento ou transporte dos alimentos, por exemplo). Já o desperdício ocorre nas etapas finais da cadeia de alimentos (venda no varejo ou em restaurantes, e no consumo em escolas e nas residências). De acordo com o relatório The State of Food and Agriculture 2019, a perda de alimentos no mundo é responsável por 14% do total descartado, enquanto o desperdício corresponde a 86%.

Em 2021, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP) divulgou o Índice de Desperdício de Alimentos 2021, que mostra que 931 milhões de toneladas de alimentos foram desperdiçados no ano de 2019 – a maior parte (61%) de forma doméstica. O estudo considerou apenas residências, estabelecimentos de varejo e indústria alimentícia, e não a produção no campo, armazenamento e transporte.

Na América Latina, 28% dos alimentos são perdidos no campo, sendo 6% na etapa de processamento e 22% por causa de infraestruturas ineficientes de armazenamento e práticas ruins de manejo. E, de todo o desperdício, saiba que 17% acontece nos pontos de venda e 28% é de nossa responsabilidade, como consumidores. No Brasil, cada pessoa desperdiça, em média, 41,6 kg de alimentos por ano.

Fatores que podem causar perda ou desperdício de alimentos:

 

 

Mesmo com 2,37 bilhões de pessoas que não tiveram acesso a uma dieta saudável em 2020, a produção de alimentos foi resultado de solo, queima de combustível e consumo de insumos agrícolas. Ou seja, a produção desses alimentos provocou aumento nas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, contribuindo para o aquecimento global. Afinal, cerca de 27% das emissões de gases de efeito estufa no mundo tem a cadeia de alimentos como origem.  Isso, sem mencionar que as 931 milhões de toneladas de alimentos desperdiçadas em 2019 poderiam atender as necessidades nutricionais de, pelo menos, 380 milhões de pessoas.

Agir rápido

 

A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da ONU representa um importante compromisso entre os países na adoção de medidas para alcançar os 17 Objetivos e 169 Metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre eles, o ODS 2 – Fome zero e agricultura sustentável traz a meta de “aumentar o investimento, inclusive através do reforço da cooperação internacional em infraestrutura rural, pesquisa e extensão de serviços agrícolas e desenvolvimento de tecnologia”, o que conecta diretamente à diminuição das perdas de alimentos. Já no ODS 12 – Consumo e produção responsáveis, a diminuição das perdas e desperdício são destacadas na meta de “Reduzir pela metade o desperdício de alimentos per capita mundial, nos níveis de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita”.

Veja o que acontece no mundo e exemplos de soluções

O menor acesso às tecnologias modernas para colheita, armazenamento e transporte de alimentos coloca os países em desenvolvimento em desvantagem. O cenário dos países mais ricos, onde a adoção de tecnologias diminui as perdas, mostra o desperdício por parte dos consumidores muito elevado. Assim, três principais soluções podem ser consideradas:

Enquanto a ciência vem fazendo a sua parte e assegurando o desenvolvimento de ferramentas para evitar a perda e o desperdício, é preciso promover políticas que facilitem o acesso e a conscientização sobre a importância da adoção dessas tecnologias em todas as etapas da cadeia alimentar.

A responsabilidade da solução é de todos e a conscientização também. Iniciativa que vale destacar vem do Instituto Akatu, que, em outubro de 2021, lançou o projeto primeiros passos com dicas valiosas para o consumo consciente de alimentos. A FAO também organizou uma lista de medidas simples que podem ajudar a evitar o desperdício:

  1. Compre apenas o que você precisa. Faça uma lista e não fuja dela.
  2. Não seja preconceituoso. Compre frutas e vegetais ‘feios’ ou de formato irregular que sejam igualmente bons, mas tenham uma aparência um pouco diferente.
  3. Verifique o funcionamento de sua geladeira e armazene os alimentos entre 1-5 °C para máximo frescor e prazo de validade.
  4. Primeiro a entrar, primeiro a sair. Ao empilhar os itens na geladeira e nos armários, coloque os produtos mais antigos na frente e os mais novos atrás.
  5. Entenda as datas. ‘Consumir até’ indica a data em que é seguro cosnumir o alimento, enquanto ‘melhor antes’ significa que a qualidade do alimento é melhor antes dessa data, mas ainda é seguro comer depois.
  6. Não deixe nada para trás. Guarde o que sobrou para usar em outra refeição ou em um prato diferente.
  7. Doe o que sobrar.

E se você pensa que suas atitudes não vão fazer diferença, confira essa dica do instituto Akatu: se uma família de quatro pessoas evitar todo e qualquer desperdício de arroz ao longo de um ano, ela irá poupar emissões que correspondem ao funcionamento de um notebook (8h/dia) e 10 lâmpadas LED (6h/dia) por três anos! Não é pouco, não!