Quando se fala em Brasil, a primeira imagem que vem à mente de muitas pessoas é a da floresta amazônica. Mas, a Amazônia não é brasileira. Nem colombiana, nem peruana, nem equatoriana. A Amazônia atravessa fronteiras da mesma forma que os rios fazem quando seguem suas trajetórias até o mar. Tudo bem que, nós brasileiros, ficamos com o maior pedaço desse patrimônio da biodiversidade, água, clima e saberes ancestrais.

Por conta da sua extensão, exuberância e importância para a biodiversidade global, a Amazônia é o bioma que costuma chamar mais a atenção com relação a medidas de conservação e ameaças ao ecossistema. No entanto, a Amazônia também tem produção agrícola e os seus 23 milhões de habitantes precisam trabalhar, produzir e gerar renda. Por isso, é tão importante olharmos para as oportunidades que a preservação da floresta em pé, em sintonia com a expansão agrícola via intensificação sustentável proporciona.

Amazônia Legal e Bioma Amazônia

Além do bioma amazônico, que compreende a área de extensão da floresta, existe também o conceito da Amazônia Legal. De acordo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), a Amazônia Legal é a definição política para a região que engloba nove estados.

Por exemplo, o Mato Grosso, tem uma parte do estado no Bioma Amazônia e outra no Cerrado, mas ele faz parte da Amazônia Legal. O Maranhão também faz parte da região, mas não é o estado inteiro. Outros sete estados inteiros estão dentro da Amazônia Legal.

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Amazônia Legal é uma área de extensão de 5.015.067,749 km², que corresponde a 59% do território brasileiro e engloba a totalidade de oito estados – Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins – e parte do estado do Maranhão. Ainda, segundo o Ipea, nela residem 56% da população indígena brasileira.

A Amazônia Legal foi instituída em 1953 e os limites territoriais surgiram a partir da necessidade de planejar o desenvolvimento econômico da região. Desde 1989, de acordo com a legislação ambiental brasileira, para a produção agrícola na Amazônia Legal, os agricultores devem preservar 80% de suas propriedades, no Cerrado 35% e nos demais biomas, 20%.

Já o Bioma Amazônia, é delimitado, majoritariamente, pelas porções desses estados ocupadas pela floresta tropical, compreendendo 4.196.943 Km² e corresponde a 40% do território nacional. Assim, estados como Mato Grosso e Tocantins, por exemplo, têm grande parte de seu território inserida no Bioma Cerrado. No Maranhão, predomina o Bioma Caatinga.

Bioma Amazônia tem produção agropecuária diversificada

A atividade agrícola no Bioma Amazônia ocorre desde antes da chegada dos portugueses ao Brasil. Algumas tribos indígenas da região sempre cultivaram mandioca e milho, por exemplo. Ainda hoje, espécies amazônicas são importantes para a vida das comunidades locais, como o açaí, o dendê e o guaraná.
A partir da segunda metade da década de 1960, quando o governo decidiu abrir novas fronteiras agrícolas, muitos imigrantes se transferiram para a Amazônia atraídos pelas grandes extensões e baixos preços da terra. Gaúchos, mineiros, paulistas, entre tantos outros, iniciaram um novo ciclo produtivo na região. Com eles, vieram as lavouras comerciais de soja, milho, girassol e a pecuária tecnificada.

A agricultura e pecuária ocupam menos de 13% do Bioma Amazônia

Segundo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) agricultura ocupa cerca de 10 milhões de hectares, aproximadamente 2,3% do Bioma Amazônia, contemplando 65 culturas diferentes. Mesmo com a introdução de lavouras exóticas, espécies nativas da região ainda têm grande importância para a economia local e nacional. Alguns exemplos: 100% da área nacional de guaraná, 75% de açaí, 24% de cacau e 56% do dendê (em cachos) estão dentro do Bioma.
As “commodities”, assim como em quase todo o país, também são importantes para as populações dos 556 municípios localizados na região. A soja corresponde a quase 6 milhões de hectares dentro do Bioma, cerca de 18% da área destinada à cultura no Brasil. O milho ocupa cerca de 4 milhões de hectares, aproximadamente 24% do total cultivado. Na região ainda estão 65% da área brasileira de girassol, 40% de algodão herbáceo, 21% de café conilon (canephora), 17% de banana, 16% de arroz, 11% de coco e 100% das áreas destinadas ao cultivo de juta e malva para produção de fibras vegetais.
A pecuária é praticada na Amazônia desde o século 17. Ainda hoje, a atividade tem papel fundamental nas fazendas instaladas dentro do Bioma. Atualmente, o rebanho bovino ocupa cerca de 44 milhões de hectares ou 10,5% do Bioma Amazônia.

Organização da cadeia produtiva é essencial contra a ilegalidade na exportação brasileira

Garantir a origem dos produtos é fundamental para o sucesso dos negócios agropecuários. Afinal, o mercado internacional quer saber a origem de grãos, carnes e frutas que compra. Dentre outros requisitos, a conformidade com a preservação ambiental está entre as exigências prioritárias.
Cientes da importância do tema, diversos setores da cadeia produtiva trabalham para revelar a legalidade dos seus produtos e para coibir possíveis irregularidades. Cabe ressaltar a Moratória da Soja, iniciativa da ABIOVE (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) em conjunto com a ANEC (Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais). Juntas, as duas entidades detêm 90% do poder de compra de soja na região amazônica. A Moratória é um compromisso firmado com o governo e sociedade civil de não comercializar nem financiar soja produzida em áreas que foram desmatadas no Bioma Amazônia após julho de 2008.
O programa se baseia no monitoramento das áreas produtoras de soja dentro do Bioma. Para isso, utiliza um conjunto de imagens de satélites de sensoriamento remoto. Fazendas que desmatam ilegalmente são embargadas. Não importa o tamanho da área desmatada, toda a soja proveniente daquela propriedade não pode ser comercializada.
Na pecuária, os frigoríficos exportadores empregam sistemas de rastreabilidade em todas as etapas da cadeia produtiva. Com isso, garantem que os produtos exportados não apresentem contaminação de ilegalidade.

Desmatamento na Amazônia

No período de 1988 a 2004, o desmatamento avançou sobre a Amazônia Legal e chegou ao pico de quase 3 milhões de hectares em 1995. Na ocasião, a área desmatada acumulada foi de 31,5 milhões de hectares, o correspondente a quase o tamanho do Maranhão. A partir de 2005, iniciou-se uma trajetória de queda, que perdurou até 2014. Ao longo de uma década, houve uma redução de 82% no desmatamento propiciada pela ênfase política e de ações conduzidas pelos setores público e privado. A partir de então, a taxa de desmatamento manteve-se estável até 2017/2018, quando voltou a crescer.
Nesse intervalo de tempo, Pará e Mato Grosso acumularam, respectivamente, uma área desmatada de 16,3 milhões (35%) e 15 milhões de hectares (32%). No entanto, o estado de Mato Grosso também registrou a mais expressiva queda na taxa de desmatamento e tem controlado a má prática graças a um conjunto de ações integradas de produção agropecuária, conservação ambiental e inclusão social (Estratégia PCI – Produzir, Conservar, Incluir), além dos avanços na gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR). O CAR é um registro público obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais da propriedade para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.
Podemos dizer que o desmatamento é originado, principalmente, da especulação de terras e da expansão agropecuária. A grilagem de terras devolutas, áreas registradas irregularmente como propriedade particular dentro de terras públicas, tem sido apontada em diversos estudos como o grande responsável pela destruição da floresta nesses territórios.
De acordo com o Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM), entre agosto de 2020 e julho de 2021, 28% do total desmatado ocorreu em áreas públicas não destinadas. Segundo o IPAM mais de 50 milhões de hectares de florestas públicas (federais e estaduais) não destinadas, onde cerca de 30% dessas áreas estão registradas ilegalmente como propriedade privada no CAR. Ao avaliar o histórico do desmatamento, no período, nas áreas cadastradas, mais de 70% do desmatamento acumulado ocorreu em áreas com CAR, o que evidencia a utilização desse instrumento para legitimar a propriedade da terra.
Esses achados evidenciam o quanto é preciso fiscalizar o desmatamento e avançarmos nas análises e validação dos dados declarados no CAR. Sem deixar de mencionar a implantação dos Programas de Regularização Ambiental (PRA), que diz respeito ao conjunto de ações que devem ser desenvolvidas por proprietários rurais para a adequação da regularização ambiental de seus imóveis.
A contenção do desmatamento requer muita responsabilidade e empenho coletivo. Mas, diante da abundância das florestas, do potencial de restauração de pastagens e o do desenvolvimento de práticas agrícolas sustentáveis que capturam o carbono da atmosfera e o armazenam no solo e nas plantas, o potencial brasileiro no mercado de carbono é muito grande e poderá gerar grande impacto nas populações locais.